Sérgio Vieira de Mello, Biografia

A proposta deste breve registro biográfico-pesquisístico sobre Vieira de Mello partiu da experiência de sua exposição na XII Semana da Paradireitologia, realizada de 08 a 16 de agosto de 2020.

A análise da atuação de Vieira de Mello sob os auspícios da Organização das Nações Unidas – ONU, teve por foco sua singularidade consciencial.

Com a hipótese de não participação em curso intermissivo antes de sua última ressoma, de acordo com registros coletados em debate no Círculo Mentalsomático realizado no CEAEC em Foz do Iguaçu – PR, é provável que esta consciência seja aluna de presente curso intermissivo preparatório para a sua próxima jornada intrafísica.

RESSOMA

Sua última ressoma se deu em 15 de março de 1948, na cidade do Rio de Janeiro – RJ, Brasil, tendo como genitores Arnaldo Vieira de Mello e Gilda dos Santos Vieira de Mello, tendo Sonia Vieira de Mello como irmã mais velha.

O avô materno Miguel Antônio dos Santos, personalidade multitalentos tendo atuado enquanto autor de musicais para o teatro, tradutor do francês e do alemão, poeta e comerciante, sinalizou para este pesquisador o rapport para poliglotismo, traço consciencial exercido por Vieira de Mello em sua carreira internacionalista.

EDUCAÇÃO

Foto: Arquivo de família.

Sua educação acadêmica inicia-se com a conclusão do ensino médio pelo Liceu Franco-Brasileiro em 1966, passando por breve semestre na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Descontente com a greves nesta universidade, solicita ao pai já diplomata, a oportunidade para estudar na França.

Iniciado o curso de Filosofia na Universidade de Friburgo, o conclui na Sorbonne em 1969. Em 1970 dá início ao doutorado em Filosofia na mesma universidade em Paris, tendo sua conclusão em 1974. De 1978 a 1985 realiza com louvor o Doctorat d´État ès Lettres et Sciences Humaines na mesma Universidade Sorbonne.

IDEIAS INATAS E ATUAÇÃO NA ONU

De acordo com a Conscienciologia,

“ideia inata é o conhecimento, a informação ou a noção sobre algo adquirido em experiência pessoal pretérita, não desenvolvido ou adquirido na atual existência intrafísica, mas em estágio evolutivo anterior, seja intrafísico ou extrafísico, capaz de compor o cabedal de conhecimentos da consciência com informações úteis, utilizadas para alavancar a evolução pessoal”. (MANSUR, 2012, p. 307)

Chamou a atenção, algumas de suas ideias inatas percebidas na pesquisa, aqui expostas:

Por estudar Filosofia no ensino médio, em meio ao início do golpe militar brasileiro, refletiu na escrita de uma redação sobre os fundamentos de um mundo justo; segundo ele, tinha raiz não na moralidade religiosa, e sim nas “ideias mais objetivas de justiça e respeito”.

A chave dos vínculos amigáveis era pautada na “auto-estima individual e grupal”, onde então a estabilidade poderia se basear “na paz e compreensão, e não no terror”.

Power, 2008, págs. 38 e 39

Seguindo no amadurecimento de seu perfil de raciocínio e gosto pela Filosofia, ao término do curso na Sorbonne em 1969, Vieira de Mello ingressa no escritório de alto comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) em Genebra, onde se torna editor assistente na sede da agência. (Power, 2008, p. 11)

Suas principais missões se basearam no Sudão, Bangladesh, Chipre, Peru, Bósnia, Líbano, Congo, Moçambique, Camboja, Kosovo, Timor-Leste e Iraque; num crescendum das responsabilidades pelas quais passou a buscar, desde as atividades de gestão para logística e distribuição de suprimentos para a ajuda humanitária até o papel de negociador, envolvendo-se segundo seus objetivos, em negociações políticas de alto nível.

Apresentou forte traço poliglota, sendo fluente em português, espanhol, italiano, francês e inglês, bem como algum árabe conversacional e tétum.

Foi casado com Anne Personnaz, ex-integrante de staff do ACNUR em Genebra, com quem teve dois filhos, Laurent e Adrien. Ao que apontam os fatos, estava em processo de divórcio quando sofreu o atentado no Hotel Canal, sede da ONU no Iraque.

Vieira de Mello at Baghdad Airport.
Vieira de Mello, bodyguard Gamal Ibrahim (right), and UN spokesman Ahmad Fawzi (left) at the Baghdad airport, June 2, 2003.

Na formação de seu grupocarma profissional, segundo Power (2008), “na ONU ele fizera seus melhores amigos – um grupo multilingüe e multicultural de “vagabundos”, como os descrevia, brincando – alguns idealistas, outros céticos, mas todos, em suas palavras, prá lá de fascinantes”. A ONU constituía sua família”.

Além do pessoal da ONU, cultivou amizades por todos os locais em que atuou.

CARISMA E FORÇA PRESENCIAL

Apresentava força presencial e atuava quando necessário utilizando de seu carisma nas negociações, com uma polida seriedade, nas tratativas das missões em que se envolveu, aqui expostas por colegas próximos, com quem conviveu:

“Sua obsessão era estar no local. Além de ser um teórico, um intelectual, um filósofo… um homem de Sorbonne, era um homem de atuar no local“.

Bernard Kouchner – Representante da ONU em Kosovo, 1999

“Nós, americanos, estamos acostumados ao uso da força. Não era a forma como Sérgio operava. Tinha a capacidade de ouvir as pessoas e convencê-las a tomar uma decisão que julgava necessária“.

Peter Galbraith – Assessor de Sérgio no Timor Leste

Na busca por soluções, foi tratar com líderes genocidas para a promoção da repatriação de refugiados de guerra no Camboja, algo nunca tentado por qualquer outro funcionário internacional da ONU.

“Um de nossos amigos jornalistas dizia que a biografia dele seria Meus Amigos, os Criminosos de Guerra, porque ele era muito famoso por lidar com esses caras ruins”.

Dennis McNamara – Diretor dos Direitos HumanosCamboja, 1992

“Quando a ONU é criticada, é quando você queria ficar o mais próximo possível de Sérgio, pois ele fazia todos nós parecermos bons. E para as pessoas que acreditam no multilateralismo, no humanitarismo, nos ideais da ONU, ele fazia com que estes ideais parecessem bons, muito bons… ele os tornava possíveis e factíveis“.

Jahanshah Assadi – Representante do ACNUR – Tailândia, 1992

A seguir, outras de suas características pessoais observadas no decorrer da pesquisa:

  • Aprender a lidar com o “mal”. Não temer enfrentá-lo, mas sem confrontá-lo; respeitá-lo. Durante a missão de repatriamento dos cambojanos, diante da crítica de um de seus colegas ao líder do Khmer Vermelho, Viera de Mello lhe sugeriu que descesse de sua empáfia.
  • Construção da dignidade humana por meio da promoção da interdependência sadia.
  • Desdramatização dos fatos com foco nos legítimos desafios e ameaças. Reflexão diante das decisões afastando pânico e medo – para ele ,“o medo é mau conselheiro”.
  • “Tinha pontos cegos e cometeu vários erros, mas nunca deixou de questionar suas próprias decisões ou a dos governos do mundo”. (Power, 2008, p. 30)
  • Reflexivo quanto às melhores atitudes a tomar para a resolução dos desafios em campo.
  • Decisões e ações no campo pautados na “economia de males”.
  • Fazer o melhor com os recursos limitados de que dispunha.
  • Trabalho ombro a ombro com as pessoas, com consciência da complexidade dos fatos que o circundava.
  • Fidelidade dos princípios pessoais à Carta da ONU na condução de suas missões e negociações. Íntegro aos valores pessoais – e um Kantiano:

“A conjetura de um direito cosmopolita é a grande inovação trazida por Kant na sua leitura da realidade internacional. Ele o fundamenta, no Projeto de Paz Perpétua, no direito à hospitalidade universal, que, para Sérgio, é a essência última do internacionalismo kantiano. Kant não vê o direito cosmopolita como uma quimera, uma representação fantástica de mentes exaltadas. É uma das condições necessárias para a busca da paz perpétua, baseada no direito público da humanidade, numa época da história em que a violação do direito ocorrida num ponto da terra vier a ser sentida em todos os outros. Tornar efetivo o direito público da humanidade, precisamente porque tinha a sensibilidade para violação do direito em qualquer ponto do mundo, foi o fio condutar que kantianamente animou Sérgio na sua atuação na ONU, cabendo destacar a importância desta sensibilidade no trato do tema dos refugiados e dos direitos humanos”. (LAFER, 2004, p. 32)

REFERÊNCIAS À MEGAFRATERNIDADE

A Megafraternidade,

“é o senso humanitário avançado fundamentado pelo sentimento de amor cósmico por todas as consciências, seres vivos e manifestações da natureza, sendo desenvolvido a partir do maior discernimento e inteligência evolutiva.”

Fonte: http://pt.conscienciopedia.org/index.php/Megafraternidade

Segundo Pereira (2010), Kant, em seu ensaio “À Paz Perpétua”, visualizou a possível confederação ou Liga entre as Nações obedientes à lei universal (cosmopolitismo moral), e que mesmo rejeitando a ideia de uma Federação de Nações em virtude da potencial ameaça de Despotismo, aponta que

“seu modelo de Confederação Mundial buscava alertar os homens ilustrados de sua época sobre a necessidade da paz definitiva entre os Estados. Segundo o iluminista, as coletividades estatais deveriam pactuar o término dos conflitos, em sentido análogo aos indivíduos quando se unem contratualmente a fim de consolidar a constituição da sociedade civil. Tratava-se, outrossim, de verdadeiro imperativo categórico estatal, a colaboração no grandioso projeto moral de construção jurídica da nova comunidade internacional. (PEREIRA, 2013, p. 91)

No andamento da pesquisa da biografia de Vieira de Mello, encontram-se exposições que fazem referência à megafraternidade transversais às ideias do iluminista:

“Kant não estava preconizando um Estado federal supranacional, e sim uma “federação de pessoas”, sem que indivíduos, grupos ou países necessitassem abandonar as suas identidades”. (Power, 2008, p. 94)

“Devemos agir como se a paz perpétua fosse algo real, embora talvez não seja. O futuro deve ser inventado.” (Power, 2008, p. 95)

Na leitura de “A Consciência do Mundo: A ONU diante do Irracional na História”, percebe-se o rapport de sua formação filosófica e seu pensamento com a Megafraternidade quando expressa:

“Cabe-nos abandonar o conforto do cotidiano, a indiferença, as ambições medíocres, o cinismo do dia-a-dia, da ausência de ideal, o emprego de nossas faculdades mentais na formulação de antivalores que são a intolerância, a xenofobia, o racismo e o fundamentalismo de todas as espécies, as certezas que rejeitam o outro a priori, que recusam o diálogo, que justificam o crime”. (VIEIRA DE MELLO, 1999, in Sérgio Vieira de Mello Pensamento e Memória, p. 90)

DESSOMA

Ocorre em 19 de agosto de 2003, devido a ataque suicida com caminhão-bomba na sede das operações da ONU em Bagdá – Iraque, provocando a dessoma de Vieira de Mello e mais 21 outros colegas da missão.

Close-up of memorial plaque.
A close-up of memorial plaque during Commemoration of World Humanitarian Day and 10th Anniversary of Canal Hotel Bombing. 19 August 2013. Photo by Jean-Marc FerrŽ

A percepção foi de que Kofi Annan e Vieira de Mello estimaram o tempo de poucos meses para a missão no Iraque. Mas resistências por parte da liderança americana na coalisão dificultaram implementação de sugestões por parte da ONU, que certamente, exigiria maior tempo para a mediação dos conflitos e trâmites dos processos políticos para o apaziguamento social.

Um paradoxo observado durante a pesquisa, foi de que Vieira de Mello atuou por 34 anos no mundo exercendo papel de Estadista, mas seus filhos não o conheciam tão bem quanto seus amigos da Organização e por onde atuou.

Lhe gerava profunda reflexão e curiosidade intelectual, a busca pela compreensão do porquê de lideranças que passaram pela Sorbonne se tornaram genocidas.

HIPÓTESE

Na realização da pesquisa, observou-se hipótese de que Vieira de Mello fosse considerado alvo da Al-Qaeda, uma organização militante salafista e extremista transnacional, que, segundo Hitchens (2005),

“(…) Os materiais usados ​​para fazer isso eram de alto nível militar, não disponíveis para nenhum “insurgente” aleatório e certamente provinham dos arsenais do regime caído. O alvo principal – e a vítima principal – era Sergio Vieira de Mello, o arrojado brasileiro enviado por Kofi Annan para reanimar a presença das Nações Unidas no Iraque. De Mello foi o mais dedicado e humano dos funcionários públicos do organismo mundial e conquistou para si opiniões de ouro no Camboja, no Líbano, no Sudão e nos Bálcãs. Mas foi o seu papel como supervisor da ONU da transição em Timor-Leste que o marcou para a morte. Um comunicado da Al Qaeda regozijou-se com o fim do “representante pessoal do escravo criminoso da América, Kofi Annan, o doente Sergio de Mello, amigo do criminoso Bush”. E continuou perguntando: “Por que chorar por um herege? Sergio Vieira de Mello é quem tentou embelezar a imagem da América, dos cruzados e dos judeus no Líbano e no Kosovo, e agora no Iraque. Ele é o primeiro homem da América onde foi nomeado por Bush para dirigir a ONU depois de Kofi Annan, o criminoso e escravo da América, e ele é o cruzado que extraiu uma parte da terra islâmica [Timor Leste]”.

Fonte: https://slate.com/news-and-politics/2005/10/don-t-bother-looking-for-explanations-for-terrorist-attacks.html

ESTÁGIO GRUPOCÁRMICO – ANÁLISE

Foi pragmático exercendo a diplomacia nas localidades de conflito ao invés de ser um teórico burocrata nos escritórios da ONU – estava na frente de batalha – apresentando veio assistencial, fazendo a diferença no mundo.

Característica cosmopolita – pessoa fora-de-série. Uma grande perda para o Itamarati.

Predisposição para a mudança é o que conta. Auxiliou centenas de milhares de refugiados de guerra em processos de repatriamentos.

Atenção voltada ao bem-estar da equipe – repercussão positiva para si no momento da dessoma?

Por ser profissional da diplomacia envolvido em situações de conflito e não na promoção dos conflitos, a hipótese é de recomposição, e não de vitimização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Assis, Jaqueline; Oliveira, Mércia; Salles, Rosemary; Círculo Mentalsomático, Vol. II; Encontros de 11 a 20; Período de 16 de junho a 18 de agosto de 2012; 00 p.; 0 partes; 00 capítulos; índice remissivo; 00 fotos; siglas; refs.; 16 x 23 cm.; br.; Epígrafe Editora e Gráfica Ltda; Foz do Iguaçu; PR; 2020; p. 144.

Mansur, Phelipe; A Verificabilidade das Ideias Inatas na Dimensão Intrafísica; Artigo; Conscientia; Revista; Trimestral; Vol.16; N. 3; Associação Internacional do Centro de Altos Estudos da Conscienciologia (CEAEC); Foz do Iguaçu, PR; Julho-Setembro, 2012; páginas 306 a 311.

Marcovitch, Jacques (Org.); Sérgio Vieira de Mello Pensamento e Memória; 338 p.; 2 partes; 23 caps.; agradecimentos; notas; 16 x 23 cm; br.; EDUSP Editora da Universidade de São Paulo; Editora Saraiva; São Paulo; SP; 2004; p. 32 e 90.

Pereira, Jayme. Princípios do Estado Mundial Cosmoético; colaboração: Dulce Daou; et al.; pref. Rosemary Salles; revisores: Equipe de Revisores da Editares; 206 p.; 3 seções; 25 caps.; 8 citações; 21 E-mails; 142 enus.; 58 estrangeirismos; 1 fato; 1 microbiografia; 1 tab.; 20 websites; posf.; glos. 84 termos; 107 refs.; 9 webgrafias; 1 anexo; alf.; geo.; ono; 16 x 23 cm; br; Associação Internacional Editares; Foz do Iguaçu; PR; 2013, p. 91.

Power, Samantha; O Homem que Queria Salvar o Mundo; Título Original: Chasing the Flame – Sergio Vieira de Mello and the Fight to Save the World; 667 p.; 3 partes; 22 caps.; epílogo; agradecimentos; notas; lista de entrevistas; créditos das fotografias; índice remissivo; 61 fotos; 1 map.; siglas; refs.; 16,5 x 23,5 cm.; br.; Companhia das Letras; Editora Schwarcz Ltda; São Paulo; SP; 2008; p. 28, 30, 38, 39, 94 e 95.

VIDEOGRAFIA

Sergio Vieira de Mello – A Caminho de Bagdá. Título Original: En Route to Baghdad; País: Brasil. Data: 2005. Duração: 56 minutos. Gênero: Documentário. Idioma: Português. Cor: Colorido. Produção: Simone Duarte; Kristine Cardoso; Anemary Soares. Idade (censura): 14 anos. Idioma: Inglês. Legendado: Português. Roteiro e Direção: Simone Duarte. Fotografia: Emmanuel Bastien. Edição: Karen Sztanjnberg. Música: Zé Luis Oliveira. Companhia: Duarte Productions LLC. Distribuição: Versátil Home Video.

Sergio. País: Estados Unidos. Data: 2009. Duração: 94 minutos. Gênero: Documentário. Idioma: Inglês. Cor: Colorido. Produção: Greg Barker, Nancy Abraham (for Home Box Office – HBO), Julie Goldman. Produtora Executiva: Samantha Power. Idade (censura): 14 anos. Idioma: Inglês. Legendado: Inglês. Roteiro: based on the book by: ‘Chasing the Flame: Sergio Vieira de Mello and the Fight to Save the World’; Direção: Greg Barker. Cinematografia: Colin Clarke e Patrick Fraser. Edição: Karen Schmeer. Música: Philip Sheppard. Companhias: Chasing the Flame, Motto Pictures, Passion Pictures, Prettybird em associação com Screen Pass Pictures. Distribuição: HBO Documentary Films (USA) e Roco Films (para demais países).

WEBGRAFIA

Hitchens, Christopher; Why Ask Why? Terrorist attacks aren’t caused by any policy except that of the bombers themselves; Slate.com; Jornal; Diário; Whashington, D.C.; USA; 03.10.2005; disponível em https://slate.com/news-and-politics/2005/10/don-t-bother-looking-for-explanations-for-terrorist-attacks.html; Acesso em 19.08.2020; 13h45.

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